Nesses poucos meses em que comecei me aventurar pelo mundo da cultura Hip Hop, seja com a pesquisa científica ou como crítico musical aqui no Raplogia, que o desejo de escrever sobre a cena de Rap na Bahia vem sendo instigado em mim. Após o impacto que vivenciei com a emergência do Novo Rap Nacional, fenômeno que me fascinou e fez com que a cultura Hip Hop fosse incorporada ao meu estilo de vida, os primeiros caminhos que percorri foi pela mata fechada do Rap baiano, abertos a facão por Frank Caraíba, meu pai, músico e grande conhecedor da cena musical de Salvador. Opanijé, Os Agentes e principalmente o RBF (Rapaziada da Baixa Fria) foram os primeiros seres encantados que encontrei nessa floresta sagrada. A partir de então, resolvi me perder em um território ainda muito pouco explorado pela crítica de Rap brasileira, na qual a questão das regionalidades e territorialidades é um grande problema. Apesar de a maioria dos coletivos e artistas da cultura Hip Hop baianxs estarem concentrados na região metropolitana de Salvador, a Bahia possui uma rede complexa que se estende por toda sua geografia e compreende desde coletivos como o Quinta Esquina daqui de Santo Antônio de Jesus (minha cidade) até a banda OQuadro lá em Ilhéus. Sendo uma cultura cosmopolita, inventada em tempos de globalização, interconexões e hibridismos culturais, a cultura Hip Hop conquistou lugares inimagináveis. Porém, no mapa desenhado pela crítica musical, territórios que compreendem principalmente a região sudeste de nosso país é onde o Rap constrói um império em meteórica ascensão. A grande e significativa concentração de produção musical, além das grandes gravadoras e plataformas midiáticas fazem do Sudeste uma espécie de paraíso distante do Rap Nacional. É só fazer o exercício em contar quantxs rappers brasileirxs que você curte e não são paulistanxs. Há um mapeamento reducionista e excludente que faz com que a diversidade do Rap brasileiro seja apagada das cartografias dos mapas sonoros, nos quais a região Nordeste possui grande relevância e seja uma bandeira identitária de rappers como o Chinaski, do Chave Mestra.
A nova mixtape lançada pelo rapper baiano Mobbiu é uma possibilidade de reterritorialização da cena do Rap brasileiro, através de um itinerário de 15 anos de carreira, carregando toneladas de experiências em suas bagagens tal qual um elefante: preservando memórias, delirando em sonhos e possuindo um desejo absurdo de voar, mesmo com a lucidez e a necessidade de estar com os pés no chão. A mixagem de DJ Índio revela o real compromisso com a estética tradicional dos samples impregnados de dendê, que nos fazem deslizar nas faixas que compõem a mixtape Por Enquanto É Isso, uma compilação de singles e participações especiais de Mobbiu em álbuns de outros artistas, em sua maioria baianxs. O Mobbiu que conheci através do coletivo Versu2 ainda conserva seu vigor e potência, porém mais maduro e experiente, um verdadeiro Notorious B.I.G. de nossa cena. A trajetória artística e vital do rapper é intrínseca à história do Rap baiano, ainda extremamente negligenciado e silenciado através de narrativas distorcidas escritas em linhas tortas, evidenciando sua indiscutível importância para a compreensão da história do Rap brasileiro, aspectos estes que pulsam nas linhas da faixa Essa Porra é Minha Vida. Minha faixa preferida da mixtape é Boss, com participação do rapper Dogalove. Os samples de uma palestra motivacional de Sílvio Santos e da canção “Castiçal” do soulman Cassiano são os mais fodas e provocam o clímax da mixtape. Com previsão de um novo videoclipe já em produção, Mobbiu abre novos caminhos para sua carreira e para o Rap baiano, dominando territórios inexplorados e construindo seu império com suas próprias mãos, rimas e batidas.
Você pode fazer o download gratuito da mixtape “Por Enquanto É Isso” aqui: https://www.jamendo.com/album/160789/mixtape-por-enquanto-e-isto-vol-1
Mobbiu é convidado especial do rapper Emicida no show do álbum “Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa” na Concha Acústica do Teatro Castro Alves, dia 4/9/2016 em Salvador-BA. Ingressos disponíveis em: https://www.ingressorapido.com.br/compras/?id=51340#!/tickets
Daniel Dos Santos (DanDan) é licenciado em História pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB), mestrando em Cultura e Sociedade pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), membro fundador e pesquisador do Núcleo Interdisciplinar de Estudos Africanos e Afrobrasileiros (AfroUneb) e pesquisador do Grupo de Pesquisa em Cultura e Sexualidade (CuS), nos quais desenvolve o #TheGangstaProject: Masculinidades Negras nos Videoclipes dos Rappers Jay Z e 50 Cent. É apaixonado pelo Drake e Kanye West. Os boxeadores negros são suas principais inspirações.