Caroline Souto tem quase 10 anos de rap. Com 25 de vida, a MC originária do bairro da Penha, zona norte paulistana, teve seu primeiro contato com o hip hop logo na infância. Criada em Itaquaquecetuba, grande São Paulo, sempre ouviu rap e samba por conta de sua família, extremamente movida a música. 

A aparição de Souto MC na cena do rap nacional foi potente. A primeira música gravada por ela foi “Redenção”, mas foi com as rimas agressivas e técnicas de “Psicosouto” que a artista fincou suas raízes e criou sua marca. Na cypher “Machocidio”, ao lado de Luana Hansen, Sara Donato e Jupi77er, ela reforçou sua postura séria e denunciou o machismo na sociedade e na cultura hip hop. 

Com o desenvolvimento artístico da MC, questões mais intimistas passaram a ficar cada vez mais presentes em sua arte. Em “Ressurreição”, por exemplo, ela deixa evidente sua ascendência indígena e a importância de retomá-la, já que foi criada no maior centro urbano do Brasil, um tanto afastada de sua ancestralidade.

“Esse processo de resgate é algo que vai durar a minha vida inteira, são vários aprendizados que estou tendo e eles não terminam. É um processo bem dolorido”, conta Souto ao Raplogia. 

Em seu trabalho mais recente e também primeiro disco, o Ritual, essas questões ficam ainda mais evidentes. Caroline Souto é uma mulher indígena que está se conectando com sua herança e aprendendo não só com os índios Kariri (povo do pai), mas também com outras populações indígenas que vivem pelo país. 

O projeto é composto por oito faixas produzidas pela Verso e pela Ganga Prod. e conta com participações de convidados importantes na trajetória de Souto: o pai Pedro Neto, Nenê Cintra – que a ajudou a se aprofundar e reaproximar do samba – Jean Tassy, Rodrigo Ogi, Bia Ferreira e Kunumi MC

Para entender mais a fundo a autoafirmação da identidade indígena e a mescla da musicalidade de povos indígenas e negros presentes no álbum, o Raplogia conversou com Souto, que também falou sobre seus planos futuros.

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Raplogia: Como se deu a criação do álbum Ritual? Quanto tempo durou o desenvolvimento do projeto? 

Souto MC: Eu estava há anos planejando fazer um disco. Era um grande sonho e eu tentei de muitas maneiras e por “n” motivos acabava nunca dando certo. Então, a gente inscreveu o projeto no Natura Musical, passamos e tivemos esse apoio. O desenvolvimento do álbum foi bem rápido, boa parte das ideias já estavam programadas. Executamos tudo isso em dois, três meses. 

No álbum, há sons de instrumentos percussivos que trazem à tona essa mistura entre povos indígenas e negros. Como você construiu essa sonoridade?

S: Eu sempre tive muitas referências musicais com esses instrumentos. Instrumentos de música  negra, de música indígena e era algo que eu queria muito incluir no meu disco. Sendo o hip hop uma cultura negra, então não faria muito sentido se não tivesse. Além disso, tem a musicalidade brasileira, que eu sempre quis colocar. Eu gosto muito de ouvir e bato sempre nessa tecla. É algo que eu me identifico, me inspira demais.

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Há também muitos elementos do samba. Como se deu essa mescla? E o seu amor pelo samba, quando surgiu? 

Bom, lá em Itaquá nós ouvíamos muito rap e muito samba. Eu fiquei sem ouvir por um tempo. Depois, eu voltei, e foi aí que senti uma vontade muito grande de aprender mais sobre a cultura do samba. Comecei a compor alguns sambas também. Daí veio “Altamira”, que eu gosto muito. Acho ela muito genuína e muito simples. E não é porque eu fiz, é porque é música. E a música fala muito mais por si só do que o compositor fala por ela. Enfim, eu sempre tive essas influências e quis trazer para dentro do disco e tenho trazido para minha música cada vez mais. 

Foto: Ganga Prod.

Quais artistas e músicas você estava ouvindo no período de construção do álbum? 

No processo de construção do disco eu ouvi muito João Nogueira e Little Simz. As minhas referências são bem diversas. Eu ouvi muito reggae, Djavan, Elis Regina, Milton Nascimento. A base do disco foi muito samba, muita música brasileira. Também escutei bastante rap. Emicida, Drik Barbosa, Kunumi. Eu os ouvi para compor o disco, para pensar no contexto, na atmosfera do projeto.

Você demorou muito para dar um nome ao álbum? Como surgiu essa ideia de nomeá-lo Ritual?

Esse nome Ritual veio de supetão, eu tinha um outro nome para o disco. Aconteceram várias coisas e eu tive que mudar, na verdade tive que descartar o anterior. Eu entrei um pouco em desespero, pensei ‘meu Deus, como eu vou achar outro nome? Como vai ser?’. Até que esse nome surgiu de uma forma muito bonita, muito intuitiva. Eu acho que ele sintetiza bastante o que é o disco. Eu gosto muito, acho ele forte e simples.

Como se deu a escolha das participações para o álbum? 

Bom, alguns nomes eu já tinha em mente para fazer parte desse álbum e outros foram vindo junto com as canções. O Ogi é uma referência muito presente para mim desde que eu comecei a ouvir rap, desde que comecei a escrever. A Bia também é uma amiga, uma parceira incrível. A Nenê Cintra também foi importantíssima nesse meu processo de contato com o samba de novo. O Jean Tassy, o Kunumi também me ensinaram muita coisa. Acho que cada um com as suas características contribuíram em inúmeras faixas do disco, não só nas que participam. Eles me ajudaram muito nas composições de letra e melodia, todos foram de suma importância para esse projeto.  

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E como foi ter o seu pai abrindo o disco com falas tão fortes?

Nossa, ter o meu pai no disco foi incrível. Ele sempre foi a minha maior referência em tudo. De pessoa, caráter, amigo, família. Foi muito importante para mim e também foi muito importante para ele. A gente tem se unido cada vez mais em várias questões, enquanto pai e filha, enquanto amigos. Então foi um marco para minha vida, não só artística, mas para minha vida enquanto filha dele. 

Outro ponto bem forte em Ritual é a conexão com a sua ancestralidade. Como foi esse processo?

Isso ainda está acontecendo. Esse processo de resgate é algo que vai durar a minha vida inteira, são vários aprendizados que estou tendo e eles não terminam, são para a vida. É um processo bem doloroso, mas ao mesmo tempo ele responde muitas questões pessoais. Esse processo nunca entra no passado, ele é presente o tempo inteiro. 

Quais os seus planos para este ano? 

Para 2020 eu quero continuar fazendo música. Tenho muitas ideias de clipes. Tem muita coisa boa vindo, parcerias bem importantes que estão para acontecer. Temos muito Ritual, galhos de Ritual por aí, para ele florescer bastante. Acho que 2020 vai ser um ano bem trabalhoso, no melhor sentido da palavra. 

Acompanhe a Souto MC no Twitter, Instagram e Facebook.

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