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Raplogia Entrevista: Issa Paz

By 5 de maio de 2016 No Comments

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Nossa entrevistada é uma apaixonada pelo rap desde os 8 anos de idade e a partir dos 12 começou a escrever suas próprias letras. A paulistana Issa Paz já tem uma longa caminhada, possuindo como referências nomes fortes como Racionais, Dina Di, Pac, Rafuagi e Shawlin.

Além do corre feito juntamente com o Pulga MC no duo Rimologia, a rapper também trampa solo. Aos 21 anos, lançou seu primeiro EP: ‘Essência’. O projeto pautado por diferentes temas colocou o nome de Issa em potencial, mas é claro que não foi somente esse aspecto que chamou atenção, mas também a qualidade com que as letras foram escritas. Aliás, não poderíamos deixar de enaltecer seu viés crítico e também as referências utilizadas no EP, que tinha menções à literatura, poesia, animes e obras cinematográficas. Definitivamente o título do trabalho, ‘Essência’, não foi questão do acaso, mas um nome pensado com consciência do ofício.  

Em 2015, Issa lançou seu álbum oficial, ‘A Arte da Refutação’, projeto que causou um belo barulho no cenário, ganhando atenção das mídias de maior referência, tendo até mesmo o Bocada Forte resenhando o projeto. Issa concretizou seu nome graças a sua qualidade, diversidade nos temas e uma fala ativa sobre os assuntos que estão em tônica na sociedade.  Logo teremos o lançamento de mais um projeto envolvendo seu nome, ‘Rap Plus Size’, projeto inteiramente em parceria com Sara Donato. Enfim, é uma honra para o RAPLOGIA trazer para vocês leitores essa troca de ideias com a Issa Paz.

1- Issa Paz, primeiramente gostaria de saber algumas de suas influências na música e como foi seu primeiro contato com o rap?

Pow, meu pai é baterista, e eu cresci ouvindo música, rock clássico, pop dos anos 80, rock dos anos 90. Mas eu sempre gostei muito de poesia, eu fazia rimas no improviso nas festas que tinha em casa, tinha sei lá, 8 anos ou menos. Depois comecei a desenvolver um interesse muito forte por poesia, e fui pesquisar, conheci o RAP, um amigo me recomendou ouvir Racionais e eu enlouqueci, comprei um CD no camelô e passei a decorar todas as músicas escrevendo tudo que ouvia num caderno. Minha mãe dizia que era só uma fase, 12 anos se passaram e espero que essa fase nunca acabe.

2- Quem acompanha sua caminhada, sabe de seu lado politizado e crítico em relação a tanto assuntos. Você acredita que o Rap é muito mais do que um gênero musical, e consequentemente seja fundamental para o mc ter uma voz ativa sobre as questões que merecem ser refletidas/problematizadas?

Sim, com certeza, RAP é a forma que eu encontrei de me comunicar com o mundo, de colocar uma mensagem válida a ser reverberada. Penso, já que as pessoas vão me ouvir, então que ouçam algo que as despertem. O rap fez isso comigo, pode fazer com outras pessoas também.

3- Em ‘Tatuagem’, faixa de seu álbum ‘A Arte da Refutação’, você rimou sobre o fato de mostrar suas cicatrizes, quando escutei isso gostei bastante, principalmente por estar issa-paz-a-arte-da-refutacaocansado de escutar tanto braggadocio na cena. Escrever coisas pessoais é realmente admirável, pois muitos têm um pé atrás quando se trata de mostrar seu âmago para os ouvintes, e você quebrou com essa barreira em muitos de seus sons. Sabendo que você também é fã de literatura, gostaria de saber se essa sua característica é resultado da influência de algum escritor em particular?

Não, isso é resultado do próprio RAP, compositores que se doam em totalidade nas tracks fazem a gente ver não só mais um interprete, mas um ser humano por trás de letra e beat. Isso nos aproxima. Eu acho que o Kendrick Lammar foi uma das maiores influencias nesse sentido. Mas também tem o AXL, o Emicida, o Kiim. Até a própria Dina Di, se expunha bastante nas letras, o Dexter também. Acho que faz parte de uma terapia, acaba fazendo bem pra quem escreve.

4- RK e Alex Lira são nomes constantes na produção de seus trabalhos, e como a combinação é sempre diferenciada, gostaria de saber como conheceu o trabalho deles e também se podemos esperar mais parcerias pela frente com esses nomes?

Sou uma pessoa apaixonada por beats. Escuto muito, gosto de improvisar em cima, fico procurando por horas e nessas eu fiz vários contatos bons de beatmakers incríveis que se tornaram bons amigos. RK, DB Beats, Diego Beatz, Alex Lira, Scooby, Kelvin Don, sempre fortaleceram com beats incríveis, tudo que eu gostei fui pegando, comprando, ganhando… Pro próximo trabalho, Rap Plus Size, escolhemos uma estética instrumental que é a nossa cara do rolê, então vai ter bastante boombap bate cabeça, trap, reggae e até funk. Fechamos com a Luana Hansen, LC mago dos Beats, BadSista, Everton Beatmaker, Indião entre muitos outros. Resumindo: vai vir pesado.

5- Você trabalhou no Cine Rima Vida, como foi a experiência e quais os maiores aprendizados que recebeu?

O Cine Rima Vida foi uma das melhores coisas que me aconteceram na vida, aprendi tanto com esse projeto e só tenho a agradecer. Fizemos por 5 anos os eventos com RAP, Poesia e Cinema nas vielas do Jardim Peri. O público era composto por crianças de 4 até 13 anos. De lá também fizemos oficinas de literatura e poesia, e dois livros com as criações das crianças foram lançados. Saiu também a coletânea com alguns artistas que já passaram por lá, chamada “Brilho Eterno”. (Tem no Youtube). Distribuímos mais de 500 livros, mais de 600 brinquedos, e toda vez q a gente colava com os equipamentos de som na quebrada era uma festa com a molecada. Eu aprendi muito com eles, vi que a quebrada não é carente só de bens materiais, mas de amor, de carinho, de atenção, saca? É foda, ali eu aprendi a amar sem precedentes, de maneira libertária e levei isso pra vida.

6- De uns tempos pra cá, alguns rappers brancos dizem que sofrem preconceito na cena por causa de sua cor. O que você acha dessa questão? Existe realmente racismo reverso?

Eu fico muito puta de verdade quando vejo gente branca, com todos os seus privilégios, que nunca sofreu preconceito racial na vida, nunca ficou sem emprego por conta da sua cor, nunca foi taxado de bandido por conta da cor da pele, nunca sofreu violência e não conhece nada de história e política vir falar que sofre ‘RACISMO REVERSO’, sério. Esse povo tem bosta na cabeça. Falta de empatia, falta de amor ao próximo, de compreensão. Branco não sofre preconceito por ser branco, deve sofrer preconceito porque tem cara de boy mesmo e não se deve confiar em playboy nenhum, eu mesma já tô ligada disso. A cultura negra sempre abriu portas e acolheu todo o mundo, mas tem que chegar com respeito e humildade, reconhecendo as raízes, entendendo a essência da parada. Quem chega falando merda, vai ser cobrado e é pocas.

7- Em ‘Quebra do Status Quo’, você e Juh Flor rimaram sobre o machismo na cena, sendo que na introdução do som vocês conversavam sobre o boicote que há por parte de alguns para com as minas que fazem rap. Esse boicote ocorre de forma constante na cena? E como você não se deixa abater com coisas desse tipo?

Ocorre de forma constante porque faz parte de um silenciamento que a sociedade reproduz com frequência. Ou seja, mulher tem nada de interessante pra falar, tem que ficar quietinha e não atrapalhar o movimento “dos caras”. Isso eu só percebi depois que conheci outras minas da cena, e vi que a parada era generalizada mesmo, e não só no RAP, mas no Hip Hop. As mulheres viraram um souvenir dentro do movimento, fomos segmentadas, fomos tiradas de várias maneiras e só sobrava o mês de março pra gente fazer show. Ainda bem que isso tá mudando, mas se a gente não apontar os erros e denunciar, essas merdas nunca vão parar. A melhor forma de não se deixar abater é bater de frente.

 8- Quando um homem faz um rap criticando o machismo que atinge as mulheres, você se sente representada pelo som ou acha que ele está tomando/protagonizando um lugar de fala que não é o dele?

Acho que não faz mais que obrigação. E seria bom se ele não ficasse só no discurso do RAP dele pra ver se pega as feminista no rolê e começasse a cobrar os amiguinho misógino que ele cola junto e passa um pano. De resto é de boas.

9-‘Respeita nosso corre’, faixa de ‘Arte da Refutação’ foi considerado por muitos como um dos mais pesados do projeto. No som rolou feat com a Sara Donato. Quem issa-saraacompanha seu trabalho sabe que se tem uma ligação forte com a Sara, sendo que um projeto entre vocês logo saíra do forno. Gostaria de saber como conheceu ela e como ela te inspira em seu som e também na vida?

Conheci a Sara em 2014 quando ela lançou a música “A Bela”, então eu chamei ela pra cantar pela primeira vez em São Paulo, no nosso evento Cine Rima Vida. Depois desse dia a gente nunca mais se largou, sempre que ela vinha pra SP ficava em casa e a gente ficava bolando planos pra dominação mundial. Daí surgiu a ideia de fazer o RAP Plus Size, Rap de gorda mesmo, e ela veio morar comigo aqui em SP pra gente trampar no disco. Minha identificação com a Sara é coisa de alma, vai muito além do estúdio, da representatividade na música, das ideias. A vida me deu uma irmãzona e eu me orgulho muito de que seja uma mina com o caráter e a personalidade da Sara. Seloko, até emociono. Ela me inspira a ser uma pessoa melhor em todos os sentidos. Aprendo com ela todos os dias.

 10- Você e a Sara estão trabalhando num álbum em parceria, chamado ‘Rap Plus Size’. Como anda o processo de criação do trabalho? Já há uma data para o seu lançamento?

Acabamos de terminar as gravações para o disco. Ou seja, agora tá na mão dos meninos da OQ Produções e eu tenho certeza que eles vão arregaçar como sempre. Desde que a Sara veio morar aqui em SP a gente tem feito um corre monstro pela cidade pra conseguir sobreviver e gravar o disco. Vendemos todos os CDs que tínhamos na porta da galeria, nos shows e na rua. Nossas conversas sempre geravam mais ideias pra acrescentar no trabalho e agora é esperar até o meio de Junho pro CD estar finalizado na mão da galera.

 11- Falando ainda sobre esse projeto em particular, parece que irá rolar músicas com as participações da Souto MC, Luana Hansen e também da Preta Rara. Como foi conseguir esses feats tão especiais? Elas estão realmente confirmadas?

Confirmadíssimas, Luana não só escreveu e gravou sua participação no disco como também produziu o beat o nosso som. Além da Souto, Luana e da Preta, tem a participação da Gabi Nyarai, Rubia RPW e a Banda de Reggae Davidariloco numa track com a Tássia Reis. Quer dizer, vai vir daquele jeito que nois gosta.

 12- O pessoal do blog também é muito fã de cinema, e de vez em quando perguntamos para nossos entrevistados quais os seus filmes prediletos. Poderia por gentileza citar algumas de suas películas favoritas?

Gosto muito de documentários então vou recomendar “Servidão Moderna”, “O Sepulcro do Gato Preto”, e “Pena”. Além desses tem também o longa de produção nacional “Querô”, foi um dos últimos que assisti e chapei!

 13- Issa, foi uma honra pro Raplogia essa troca de ideias. Caso queira deixar uma palavrinha final, fique à vontade. 

Agradeço imensamente pelo espaço e queria dizer que todo penúltimo sábado do mês rola a batalha “Dominação”, Batalha de Freestyle feminina de conhecimento, na São Bento, a partir das 17h. Apareçam!

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