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Review: Kendrick Lamar – To Pimp a Butterfly

By 4 de abril de 2015 No Comments

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Ouvir To Pimp a Butterfly é uma experiência muito mais complexa do que ouvir o seu antecessor, Good Kid, Maad City. O recém lançado disco de Kendrick busca cutucar mais assuntos que estão em pauta há alguns anos, criando sim um conceito. Mas ele não explora uma história no background como fez com o seu disco de 2012.

Kendrick agrada os ouvidos de quase todo o cenário desde que lançou o Section.80 em 2011, quando englobou temas parecidos com os desse disco, mas em produções extremamente diferentes. Em 2012, ele atingiu o mainstream em cheio com good kid, m.A.A.d city, um disco que conta traz uma história baseada toda na vida de Lamar. To Pimp a Butterfly nem existia, mas já tinha fãs o esperando desde todo o boom de GKMC. Quase três anos depois, o disco supriu todas as expectativas, mas traz um tom bem diferente do que estamos a ouvir de Kendrick desde o seu disco de 2012. To Pimp a Butterfly é bastante político, é também bastante emotivo – pois assim como explora narrativas sociais, mergulha na depressiva mente de Kendrick, que perdeu pessoas queridas mesmo após a fama. Ao terminar o disco, um fato é certo: KDot sugou toda a influência que podia do funk e do soul. O disco abre com o lendário George Clinton, do movimento funk Parliament-Funkadelic, fazendo o refrão. Wesley’s Theory mostra como os negros são “cafetinados” na mídia, para depois o sistema os punir. Para ilustrar a faixa, como metáfora o rapper usou a prisão do ator Wesley Snipes por evasão de impostos em 2010. Em King Kunta, outra faixa com uma pegada bastante funk, Kendrick incorpora uma versão do século 21 do escravo Kunta Kinte, da história Roots. Kendrick faz uma relação interessante sobre a história do escravo do século 18 e a sua vida. Em Roots, Kinte se recusou a receber um nome de escravo, e teve seu pé cortado por suas tentativas de fuga, fazendo disso uma metáfora para resistência contra organizações opressoras. Além disso, Kendrick usa uma narrativa sobre sua saída do gueto para o estrelato como rapper, em uma forma de fuga, assim como Kinte, ele não queria ser “escravo do sistema”. Até a faixa u, o disco segue lutando contra injustiças, violência, e opressão. Ao dar play em u, o negócio muda. A faixa é profunda, obscura, é o contrário da já conhecida i. Nela, Kendrick fala sobre depressão, perda de amigos, e inseguranças. O flow de Kendrick no segundo verso, imitando um choro, deixa o clima da faixa mais negativo ainda. Mas u é uma das melhores faixas do disco. Logo após essa faixa, Kendrick apresenta Alright, aonde captura os momentos positivos após a depressão – figuradamente, Kendrick nos afunda em suas depressões, e nos conta como tudo mudou logo após isso, como em uma sessão com um psicólogo. Após esse meio de disco mais sentimental, o projeto volta a ter um cunho mais político. Dessa vez, Kendrick fala bastante sobre estereótipos em que a sociedade tem sobre os negros (The Blacker The Berry), sobre como o gueto é afetado pelo governo e suas artimanhas (Hood Politics) e sobre colorismo (Complexion (A Zulu Love)). K.Dot procura nos ensinar sobre suas raízes africanas, sobre a injustiça racial, e exaltar a igualdade. Curiosamente, ele não aborda um assunto que hoje está bastante em pauta relacionada a temas raciais: a famigerada apropriação cultural. O disco de Kendrick propaga uma sensação de união, é só ouvir i e você vai sentir isso. E falando nela, a faixa que ganhou dois Grammys na última premiação, i, teve retoques para o disco, ficando muito melhor. Com destaque para o discurso de Kendrick sobre a palavra negus. Kendrick fecha To Pimp a Butterfly com Mortal Man, que se destaca mais pela conversa com Tupac ao fundo do que pela música em si. A conversa foi feita com uma entrevista de ‘Pac cortada em partes, com Kendrick fazendo perguntas para ele após soltar um poema. Esse poema tem uma parte em cada faixa, se formando através do 78 minutos de disco.

Dr. Dre é produtor executivo do disco – junto a Anthony “Top Dawg” Tiffith –, ele participa apenas em um skit de Wesley’s Theory. Não aparece em nenhuma produção. Ele e Top Dawg devem ter acompanhado e acertado as coisas no projeto. TPAB tem diversos produtores, com destaque para Soundwave que aparecem oito faixas, e Terrace Martin, que aparece em seis. Quase todas as faixas trazem mais de um produtor, nos presenteando com uma ótima mistura de sons. Além dos dois produtores acima, estão no disco alguns artistas como Thundercat, que aparece frequentemente no projeto também; Flying Lotus (Wesley’s Theory), Pharrell (Alright), Rahki, LoveDragon, Boy-1da, entre outros produtores de menor nome. Como já citado anteriormente no texto, o projeto, a presença do funk e do soul são notórias no disco. The Isley Brothers, James Brown, Fela Kuti, Boris Gardiner, e Lalah Hathaway, são alguns dos artistas com cortes no disco (você pode ver a lista completa aqui). O trabalho tem uma belíssima produção graças a todos esses elementos. Particularmente, gostei da produção desse disco perante aos anteriores. Em partes, lembra o G-Funk, mas também traz originalidade em um cenário que hoje tende a se repetir.

Com o título inspirado no livro To Kill a Mockinbird, podemos dizer que o projeto é sim um dos mais complexos lançados nos últimos anos. Kendrick Lamar buscou mostrar que a sociedade negra é caracterizada como lar de bandidos, malandros, em vez de ser caracterizada como lar seres humanos extraordinários. É um projeto bastante sério, e que se estudado faixa por faixa, referência por referência, irá adicionar muito mais conteúdo em nossos cérebros. O único ponto fraco é o tamanho do disco, que dura 78 minutos. Mas confie em Kendrick, o disco supre todas as expectativas, e certamente irá render muitas matérias pela internet até o fim do ano. Boa ouvida!

A imagem que ilustra o texto não é a capa do disco, mas faz parte do ótimo encarte. Dá uma olhada nas outras imagens clicando aqui.

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Jhonatan Rodrigues

Jhonatan Rodrigues

Fundador do Raplogia em 2011. Ex-escritor do Rapevolusom e ex-Genius Brasil. Me encontre no Twitter falando sobre rap: @JhonatanakaJoe