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Trocamos uma ideia com Coro, o MC brasileiro selecionado pelo Converse Rubber Tracks

By 20 de dezembro de 2015 No Comments

Este conteúdo é um publieditorial da Converse Rubber Tracks.

“Fé no jogo é a regra e é algo espiritual pra mim
Paz em dobro, a guerra é algo cultural de onde eu vim”

Em setembro deste ano, o projeto Converse Rubber Tracks selecionou 84 artistas para gravar em 12 estúdios ao redor do mundo por onde já passaram grandes nomes da música. Na lista, figuram, por exemplo, o Sunset Sound em Los Angeles, EUA, e o Tuff Gong em Kingston, Jamaica. Dentre os 7 brasileiros que participaram do projeto, apenas Coro é rapper. O MC de Fortaleza contou com ajuda do renomado engenheiro de som Geogg Sanoff e da ilustre visita do MV Bill, numa session no Toca do Bandido, estúdio no Rio de Janeiro no qual o rapper trabalhou.

A gente trocou uma ideia com o Coro, tanto sobre a experiência de participar do projeto da Converse quanto sobre sua carreira. O papo é extenso e bem maneiro, o resultado ta aí. Mas antes, aperta o play no som do cara:

Sua imersão no mundo da música, de forma ativa, já tem alguns anos, certo?! Como exatamente começou?

Sempre tive muito contato com a música porque eu cresci na Igreja. Quando eu tinha uns 11 anos, meus pais se separaram, então abandonei a música, aconteceram muitas coisas no período da ausência do meu pai, na minha adolescência, e ainda me envolvi com altas paradas erradas. Escrevi minhas primeiras letras em 2005, com uma banda que eu comecei a fazer parte e depois fiz outras letras em batidas gringas, que o Sid, um dos integrantes do RDF, me emprestava pra escrever junto com um amigo, o Assis. Essa história é engraçada, porque era um único CD de batidas que ele tinha e, na época, a tecnologia não era tão acessível, era difícil até fazer a cópia de um disco. Nesse CD de batidas gringas, tinham umas 10 Batidas, mas a gente só podia cantar em cinco dessas, porque nas outras o Sid já cantava. Naquele tempo, ele ainda não era do RDF , era do D’Rocha, um grupo dele, com mais dois brothers dazarea que infelizmente pararam.

Mas eu só gravei o meu primeiro som em 2006, já fazendo parte do RDF, o Padêro me fez um convite através desse amigo que escrevia comigo e me levou pra conhecer o Erivan Produtos do Morro e foi lá que eu gravei a primeira faixa, então costumo dizer que comecei mesmo em 2006, porque foi o ano que eu gravei o primeiro som.

RDF é um grupo que você leva em paralelo com a carreira solo?

Sim, RDF é um grupo da Costa Oeste de Fortaleza, modéstia à parte, considerado na zárea, formado por mim, Padêro Mc, Sid e Babu. A gente sempre conta com Flip Jay como nosso Dj.  

Todas as pessoas que acompanham de verdade o RDF já sabiam que eu ia me dedicar à carreira solo. Eu já vinha me preparando desde o primeiro disco da gente e produzindo o solo mesmo, valendo, desde 2012. Também tinha lançado um single, em 2014, anunciando o solo, mas o RDF continua ativo, sempre que aparece uma oportunidade a gente tá dentro.

Como você analisa seu processo de maturação artística ao longo do tempo? Você consegue quantificar isso?

Eu sempre tive vontade de aprender sobre música, tenho ouvido bom. Aprendi a tocar violão, flauta e gaita sozinho. Já teclado, eu tive um pouco de orientação quando era criança, mas se você fala de evolução no Rap, é mais que visível a minha. Quem ouviu as minhas primeiras músicas e escuta hoje as novas, percebe isso inegavelmente.

Eu não produzia quando comecei a fazer Rap, nem ao menos tinha noção de como se produzia um beat. Quando eu vi o Erivan produzindo no FL Studio 4 fiquei maravilhado, prestei atenção em cada movimento dele e quis aprender a fazer. Eu vi que tinham notas musicais dentro do software e percebi que se eu conseguisse chegar ali naquela ferramenta eu ia saber o que fazer. Eu participei de todo processo de produção do disco “O Que Eu Fui e o Que Sou”, o primeiro disco do RDF, eu tocava o violão, o Erivan gravava e colocava os drums em cima, enquanto isso eu aprendia olhando.

Certo dia, perguntei se ele poderia me dar o setup do programa e ele me deu. Produzi o meu primeiro beat numa lan house, então eu alugava tipo 3 ou 4 horas pra estudar bem o programa, na época eu não tinha computador.

Meu pai, mesmo separado da minha Mãe, sempre foi presente com a responsabilidades financeiras em relação a gente e em um determinado período ele saiu do emprego e recebeu as contas e vendo o quanto eu estava envolvido com as pessoas mais perigosas do bairro, perguntou se eu queria alguma coisa. Ele queria comprar pra mim uma máquina de lava jato pra eu Fazer alguma coisa da vida, mas eu falei que queria um computador, então ele comprou meu primeiro PC. Não era uma Máquina de primeiro Mundo, era um PC como os de Lan House, mas foi onde eu aprendi o básico de produção.

De que forma os ambientes que você frequenta se relacionam com a música que você faz?

É um clichê batidão, mas escrevo sobre o que vivo, sobre o que sinto, sobre o que busco ou almejo, então, automaticamente, o ambiente em que me encontro se insere na minha música. A verdade é que muita gente fala que escreve sobre a vida e tal, mas nunca estão na rua, nunca falam do seu bairro ou da sua cidade.

Se isso dá certo?! Dá sim, tem um monte de MC mentiroso por aí.  Mas eu não. Tenho um Bairro todo de testemunha, não preciso provar nada, saca?! É só colar nas Goiabeiras que os pivete fala.

O Ceará possui uma cena Hip Hop muito interessante que remonta a história do Movimento Hip Hop Organizado do Ceará (MH2O-CE), por exemplo. De que maneira seu trabalho e o trabalho de rappers cearenses como o RAPadura Xique-Chico se inserem e contribuem para essa cena atualmente?

Acho que todo trabalho feito com amor à causa contribui para a cena, nem que essa causa seja a sua causa. Apesar de não terem reconhecimento justo, todos os grupos daqui estão produzindo música, discos, vídeos e trabalhos que de alguma maneira somam com a cultura Hip Hop. Ter o trabalho levado pra outros lugares é apenas uma questão de tempo, mas há de se frisar que temos um leque enorme de diversidade na cena loca de rap. Atualmente há vários estilos, pegadas e influencias.

O que eu sinto é que a galera tá falando muito de postura, mas não da sua postura e sim da postura de outros Mcs. Imagino que o que pode somar mais com a nossa cultura local, hoje, é aceitação.

Entender que não é porque seu Rap fala sobre crime e o do outro fala de droga, e o do outro fala de amor, que todos têm que conviver em extremo estado de separação e isso não soma, só divide.

Você é muito influenciado pelo Gospel e isso está presente no processo criativo de suas melodias, como você já afirmou em entrevista ao canal da Converse. Quais são suas outras influências musicais?

Na verdade, ouvi muita musica gospel na infância, porque meus pais me criaram dentro da Igreja. E, além de musica Gospel, eu não ouvia muito além do que tocava nas rádios, os vizinhos sempre ligavam o som dos rádios bem alto e eu acaba ouvindo e me acostumando com o que a massa escuta e dissemina, os hits sertanejos todos dos anos 90, musica romântica  e todas aquelas que tocavam nas rádios naquele tempo, até eu criar o meu próprio senso crítico e começar ouvir outras coisas. Na Adolescência, ouvi muito Rock, eu nunca fui muito de me prender a rótulos, apesar de na cena do rock ter bastante isso, eu ouvia de tudo, Punk Rock, Hardcore, RapCore,  Grounge, Metal. Bandas de Rock nacional como Legião Urbana, Los Hermanos, CBJR, Planet Hemp, Raimundos. Depois veio o Rap, os primeiros que eu ouvi foram Racionais, Cirurgia Moral, SNJ. Isso, antes de fazer Rap, depois que eu comecei a produzir, ouvi muito RZO, DBS, MV Bill, Costa a Costa, The Game, Snoop Dog, Dr Dre, Jay Z,  Kanye West, Eminem e vários outros. Também curto Black Music. Em geral, eu adoro Soul e sempre gostei de Soul, só não sabia que se chamava Soul antes, mas já curtia.

Muitas coisas são referencias pra mim hoje em termos de Produção e levada. Ultimamente, escutei muito Dirt Soul, T.I , Travis Scott, Asap Rocky e Ro Ranson. Eu me senti dentro do Ritmo. Curti as levadas e me adaptei. Estou produzindo um trabalho praticamente quase todo influenciado nisso.

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Quem trabalha contigo pra canalizar essas inspirações e materializar as ideias?

Billy Gringo, sem dúvidas ele é o melhor produtor de Rap, hoje, aqui no Ceará. Quem negar isso, simplesmente não tem noção nenhuma sobre o que está falando.

Ele tem um feeling pro estilo que direciona qualquer um a tirar o seu melhor, ele saca muito, ele que me apresentou Dirt Soul e Trap. Eu não escutava antes, ele falou: “Você precisa fazer algo assim”, me perguntou quantos trampos eu tinha, pediu pra ver, mostrei e ele curtiu. Fechamos uma parceria e produzimos o disco do RDF, Coração Vagabundo, alguns trabalhos do Carlos Gallo, algumas tracks e dois EP’s, e, do meu trabalho solo, o EP “2012 O Começo”, em Janeiro desse ano. Apenas com esse EP, consegui ser ouvido por pessoas influentes na musica do país e elas perceberam a qualidade do trabalho. Com isso, fui levado para gravar num dos melhores estúdios do mundo.

Certo que eu já venho me empenhando há anos, mas o trabalho que eu apresentei para o Rubber Tracks foi esse EP.

O processo de produção com o Billy é bem dinâmico: eu crio os beats do zero e ele retimbra os Drums e Synts que não combinam. Ele retimbra, mixa e no final o resultado sempre fica bom.

O Novo Rap Nacional surgiu nesses últimos anos de forma meteórica e já domina o mercado fonográfico brasileiro, como também provoca grande interesse e notável recepção do mercado estrangeiro. Qual são os aspectos de sua estética musical que configuram um diferencial dentre tantas e tantos rappers em circulação?

Só de você ser um MC do Nordeste já configura um diferencial, nossa dicção e dialeto são completamente diferentes das demais localidades do país e o legal é que apesar de ser diferente as outras regiões do país nos compreendem muito bem.

Acho que o Brasil ja conhece bem a realidade do Sul e Sudeste, afinal, todo o resto do Brasil precisa assistir e ouvir o Sul em todos os meios de comunicação, porque é o que rola. Nosso jeito de fazer Rap e nossas condições já caracterizam essa diferença, ou seja, qualquer trabalho bem produzido que vier daqui com identidade , vai soar diferente pro Brasil inteiro.

Segunda-feira, 7/12, a playlist do Converse Rubber Track foi lançada oficialmente. Como foi ser selecionado para o projeto? Como foi saber que você participaria?

Definitivamente, foi a melhor coisa que já me aconteceu dentro da música, não digo na minha vida, porque tenho filhos, e os considero a melhor coisa que já aconteceu na minha vida, mas o Rubber Tracks foi como um sonho. Eu não conseguia crer quando recebi o e-mail. Era umas 17, eu fiquei louco e fui na hora avisar pro meu produtor.

Ele que pediu pra eu me inscrever. Quando o fiz, eu não botava fé, acessei o site e vi tudo em inglês, comecei a preencher os dados pensando: “- Por que Billy mandou eu me inscrever nisso, nunca que americanos vão escolher um Rapper do Brasil pra um evento que nem de Rap é”, subestimei meu próprio trabalho. Desde que decidi, em 2010, buscar uma postura profissional e me aprimorar em produção, em letras e também em burocracia. Mudar a forma de trabalho, buscar sair do amadorismo pro profissionalismo, mudou muito a visão que alguns grupos do Ceará tinham em relação a gente e abriu portas. Ter sido selecionado para o Rubber Tracks foi a prova mais concreta de que quando você não se limita aos padrões, você consegue expandir mais suas ideias e, consequentemente, os resultados das suas ideias.

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E como tem sido ver a repercussão desse projeto?

Tem sido muito bom, é um sentimento misto de satisfação com “agora preciso trabalhar mais”. Tenho muito o que agradecer à galera da Converse pela oportunidade, à galera da Vice e à galera que trabalhou no vídeo, aos meus amigos e fãs que acompanham e à galera do Rap Ce por ter fortalecido, divulgando e me parabenizando pelo feito.

MV Bill é um dos maiores artistas de Rap do nosso país. Como foi ter a visita dele durante a gravação do projeto? Existiu uma pressão maior? Como você lidou com isso?

Foi muito loko. Quando a gente admira uma pessoa sempre é um choque ver ao vivo, eu já tinha conhecido ele pessoalmente em 2006, na Rádio Universitária. Engraçado que, no dia de ir ver ele na Rádio, eu criei uma capa pra uma demo do RDF com papel 60 quilos. Fiz um desenho de favelinha igual aos desenhos que eu desenvolvia no Projeto 4 Varas, um projeto Social pra Jovens Carentes e Problemáticos do Bairro do qual eu fazia parte quando eu era adolescente. Fiz a capa e levei pra entregar a ele, a demo tinha umas 5 ou 7 músicas e ele curtiu muito o trampo da capa. Quando mostramos a foto da gente entregando o disco pra ele em 2006, ele falou;

“Caramba, maluco, eu tenho esse CD até hoje”, quase 10 anos depois.

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A gente trocou muita ideia de bairro, de coisas que aconteceram com ele, de coisas que aconteceram com a gente, sobre Rap, sobre como montar discos e ele se identificou muito com a gente que acabou ficando muito mais tempo do que estava programado. Trocamos contato e não me senti pressionado em nenhum momento com a presença dele. Só na hora que ele chegou de surpresa, mas depois que vi ele, ele conversou comigo de igual pra igual, como de amigo pra amigo, saca?!  Foi muito louco, eu fiquei muito grato pela presença dele.

Durante o Rubber Track, você conseguiu produzir bastante, a velocidade com que gravou as faixas foi bem alta, tanto que você pôde fazer bem mais do que o planejado. “Insólita Sensação” nasceu no Toca do Bandido ou você já tinha ela pronta?

Eu postei um texto no Facebook no dia do lançamento que responde exatamente essa pergunta:

“Quando fui selecionado para o Rubber Tracks eu soube que ia pra Los Angeles, e depois de muita correria fomos pra Recife, Padero, Sid, Gallo e Eu. Lá tivemos as solicitações de visto negada, como alguns já sabem.

Enfim, quando voltamos de Recife, eu estava triste, porém conformado com o que aconteceu. Eu sabia que ainda ia rolar a minha sessão, mas isso não me impediu de refletir sobre tudo que eu venho fazendo há 9 anos.

Pensar em desistir, em arranjar outro emprego -pois abdiquei do meu para viajar, apesar que eu também já tava cheio- pensar no que os vizinhos e os Zé Povinho falam te achando um louco sonhador, se vale a pena passar por tudo isso mesmo pra não ter a vida comum, programada e chata que a gente ver tanta gente vivendo.

Essa reflexão ficou na minha mente e se misturou no feeling que estava em mim depois do que aconteceu no consulado.

Então, como mais um dia produzindo no meu home, eu estava despretensiosamente criando um beat e que me trouxe vários flashes de todas as dificuldades que a gente enfrenta nessa estrada, então comecei a escrever um rascunho sem nenhuma pretensão também, olhando pra minha casa, pros meus filhos, pra minha mulher gestante, mas também pesei os dois lados, o negativo e o positivo, do que eu vivo e  vivi, e juntei com o que veio acontecendo ultimamente. Então fiz esse som. Essa música nada mais é que um divã comigo mesmo, é como se fosse um papo entre o meu sonho e a minha mente, como se o meu sonho estivesse dando umas dura na minha mente na primeira estrofe , e na segunda como se minha mente fizesse um desabafo pro meu sonho, é bem assim que eu retrato. Imagine o que é isso e você vai sentir o mesmo feeling que eu.”

Nessa track, você lança um olhar sobre a própria trajetória e descreve o momento presente pra anunciar um futuro bom. Nada de autoafirmação, longe disso, afinal a prova pra chegar até aqui foi hard. Como você tem vivido esse feeling? E quais são os próximos passos?

Com o pé no chão, não quero ser mais que ninguém, tô só fazendo o meu, colhendo o que eu plantei.

O próximo passo é um EP do Rubber Tracks. Também fiz uma parceria com a Vz Arte, que tá produzindo o meu material audiovisual e ainda esse mês vamos lançar, no Canal do youtube, um vídeo de uma música ao vivo e o clipe de Insólita Sensação.

Cara, tem algo mais que você queira dizer? 

Aos meus amigos, fãs e às pessoas que acompanham e apoiam o meu trampo: Muito obrigado, de coração, pelo incentivo e por fortalecerem a caminhada, sem vocês nada disso seria possível. Paz!

Abaixo você confere a playlist gravada no Converse Rubber Tracks:

UPDATE: O EP gravdo no Toca do Bandido, “Vem Desse Naipe”, já está disponível para streaming no soundcloud. O link para download é disponível na descrição do álbum. Confira:

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