Arte por Amanda Jungles (@jnglls).

O ano era 2013 e as coisas eram mais simples. Não havia pandemia, o dólar era em média dois reais, e tínhamos um presidente – ou melhor, presidenta. Mas fora isso, foi um ótimo ano para o hip-hop também: A$AP Rocky debutava com “Long. Live. ASAP“; Ghostface Killah começava sua série de projetos incríveis dessa década com “Twelve Reasons to Die; tivemos “Yeezus” de Kanye; “Watching Movies with the Sound Off” de Mac Miller e muito mais projetos interessantíssimos. Foi um ano de respeito.

Foi nesse mesmo ano que um projeto sem muitas pretensões chegou aos ouvidos dos amantes das produções de Alchemist e um rap de qualidade: “My 1st Chemistry Set”, de Boldy James, rapper criado em Detroit, porém, natural de Atlanta.

A carreira de Boldy James começou tardia para os parâmetros atuais do hip-hop e aos poucos. Em 2009, ele participou de duas músicas na mixtape “Merry Christmas“, do grupo The Cool Kids com Don Cannon – o rapper é primo de Chuck Inglish, membro do grupo. Caminhando de faixa em faixa, em 2011 o artista nos presenteou com a mixtape “Trappers Alley Pros and Cons“, ganhando a atenção do cenário e de algumas publicações, como a Pitchfork. Em 2012, tivemos a mixtape “Consignment”, seguida em 2013 de um EP intitulado Grand Quarters. Todos projetos bastante concisos e recebendo uma atenção bacana de crítica e público. E foi em 2013 que tudo mudou…

My 1st Chemistry Set“, como citado anteriormente, chegou e elevou o nome de Boldy a todo o território americano, afinal, ele estava ao lado de ninguém menos do que The Alchemist, que tem o hábito de lançar projetos colaborativos com rappers há anos. Em 2013, esse foi um dos meus projetos favoritos – inclusive fez parte de algumas listas do Raplogia, que se perderam durante mudanças de servidor.

O projeto colaborativo tem treze faixas e quase cinquenta minutos de duração. Em todas as faixas, obviamente produzidas por Alc, o rapper traz rimas cirúrgicas e de ótima qualidade. Apesar de ter feito corres nas ruas de Detroit, o Boldy não se perde nesse assunto e explora rimas cotidianas, misturadas com contos das ruas.

Com uma ótima repercussão entre críticos e o público, Boldy teve uma oportunidade única em 2014: ser o primeiro artista da Mass Appeal Records, gravadora do grupo nova iorquino homônimo encabeçada por ninguém menos que Nas, que levou o rapper para o palco no SXSW 2014.

O relacionamento que parecia tornar Boldy um rapper famoso e elevar sua carreira ruiu com pouco tempo. A Mass Appeal nunca foi capaz de tornar o artista um dos seus principais, e com outros focos, a música dele era lançada esporadicamente.

Durante sua relação com a gravadora, poucos projetos foram lançados. Duas mixtapes, em 2015 e 2017, e um EP também em 2017 fecharam a carreira de Boldy James com a Mass Appeal.

O rapper, que era envolvido com o tráfico de drogas antes de sua carreira, sentiu a grana diminuindo:

“Eu não conseguia entender de início, pois você tá ligado, nas ruas o dinheiro está ali na hora. Eu não precisava esperar. Com a música, as coisas precisavam se materializar. O trabalho tinha de ser lançado e receber certa atenção para os ganhos voltarem. Várias vezes, eu estava perdendo o foco porque eu não estava fazendo grana rápida. Eu costumava viver uma vida diferente, então eu começava a pensar em voltar para as ruas e recomeçar meus corres, quando na verdade, esse corre da música é algo que você precisa masterizar,” disse Boldy em entrevista.

 

Sua desilusão com a música também era devido o estilo que o rap estava tomando. Seu estilo sempre foi mais metódico, e as produções deveriam seguir sua estética. O que era extremamente diferente dos rappers de sucesso, que lançavam músicas para os clubes. Mas foi um conjunto de artistas que trouxe a chama de volta para Boldy

Boldy teve problemas com a lei durante esse período que estava longe dos holofotes. Pequenas idas e vindas da cadeia, condicional, mas nada que o tirasse do mundo do rap por muito tempo.

A “segunda onda” de Boldy James veio em 2020 e trouxe uma estética que nós estávamos muito habituados, devido o recente sucesso da Griselda Records. Um “boom bap” mais moderno, trazendo um estrondoso sucesso nas vozes de Benny The Butcher, Conway the Machine e também Westside Gunn. Todos contemporâneos do rapper.

Além da Griselda, Boldy trouxe a parceria com Alchemist de volta no projeto “The Price of Tea in China“, lançado em Fevereiro de 2020 e certamente um dos melhores do ano.

As colaborações com Alchemist recomeçaram em 2019, com o EP “Boldface”, lançado pela ALC Records. Um trabalho de 15 minutos, que serviu para recolocar Boldy James no jogo.

Em Março, notícia excelente: Boldy James assina com a Griselda Records. Parceiros através de colaborações musicais, agora o nível entra em outro patamar, e o rapper agora faz parte de um dos mais emergentes coletivos da década.

A plataforma que a Griselda dispõe para Boldy James é perfeita. Todos os olhos estão voltados para o selo de Buffalo, como já falamos nesse artigo.

Buffalo e Detroit são primas distantes,” disse o fundador da Shady Records, gravadora que distribui a Griselda, Eminem, na música “Machine Gun Black“.

Mesmo sobre o selo da Griselda, o rapper lançou de forma independente a mixtape “Manger On McNichols“, um trabalho de quarente e dois minutos sem muitas participações, e com toda a produção feita pelo produtor Sterling Toes.

Manger On McNichols” é bem experimental, e é nela que o rapper demonstra uma versatilidade imensa. Ele prova aqui que consegue levar um projeto sozinho sem qualquer problema.

O seu próximo projeto em 2020 foi “The Versace Tape“, o primeiro sob o selo da Griselda. Produzido inteiramente por Jay Versace, ex-estrela do Vine.

Outro projeto sem muitas colaborações, mostrando seu talento solo. Boldy pode facilmente se comparar com o trio de ouro da Griselda: Benny, Conway e Westside. Ele é tão talentoso quanto.

Extremamente técnico, ele se destaca muito pelo seu storytelling, tiradas cômicas, punchlines. É um rapper completo.

Aos 45 do segundo tempo, junto ao time designers de roupa e produtores Real Bad Man, Boldy James lança “Real Bad Boldy”, seu últimop projeto de 2020 e que fecha o ano com chave de ouro.

É interessante ver que um rapper que lançou três projetos em um espaço de três anos, conseguiu lançar quatro em apenas um. Renovar os ares foi excelente para Boldy James, que respirou e trouxe uma leva de projetos de extrema qualidade.

Junto ao pessoal da Griselda, é quase certo falar que a carreira dele tomará um caminho muito grandioso daqui para frente. Boldy James precisa apenas de um estúdio, é só colocá-lo lá que é rap de qualidade na certa.

Caso você não o conhecia, bem-vindo ao mundo de Boldy James, um dos melhores rappers de 2020.

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Jhonatan Rodrigues

Jhonatan Rodrigues

Fundador do Raplogia em 2011. Ex-escritor do Rapevolusom e ex-Genius Brasil. Me encontre no Twitter falando sobre rap: @JhonatanakaJoe