Como uma de suas músicas destaca, Stefanie é de fato uma mulher MC. Nascida e criada em Santo André, ABC paulista, foi influenciada pelas letras politizadas dos grupos de rap dos anos 90 e, e em 2004, decidiu fazer parte da história do hip-hop.

Dividida entre o trabalho como vendedora e os palcos, ela avaliou com cuidado o queria fazer. A decisão não foi fácil, já que o filho Humberto já tinha nascido e precisava dar conta das despesas da casa. No final, acabou escolhendo o rap. Ainda bem!

Agenciada pela JAMBOX, plataforma criativa só de mulheres e integrante do grupo Rimas & Melodias, Stefanie participou de diferentes projetos como o grupo Simples e o coletivo Pau-de-dá-em-doido. Ao longo de sua carreira, abriu shows de artistas como De La Soul, Talib Kweli, Pharoahe Monch, Black Alien, entre outros. 

A artista é referência para muitos e muitas. E ela sabe do peso de sua figura e da potência do que fala. Por isso, usa a música para trocar ideias com as pessoas e para inspirar outras mulheres a seguirem seus sonhos, sejam eles na música ou em qualquer outra área. 

“Hoje eu olho pra trás e vejo como nos mantiveram engaioladas, nos limitando, e me sinto privilegiada por caminhar lado a lado de mulheres que me ajudam a enxergar todos os dias o quanto somos foda e quanta coisa podemos e ainda vamos fazer. Quantas meninas vão olhar a nossa trajetória e pensar “Eu também posso!”. Vejo isso em cada show quando vejo olhos de crianças brilhando, e isso me enche de esperança. É muito importante que as novas gerações enxerguem um futuro bem diferente do presente em que vivemos”, ressalta. 

Conversamos com Stefanie sobre rap, samba, o lançamento do seu primeiro álbum, maternidade, processos criativos e o que tem passado na cabeça dela durante o isolamento social. 

Raplogia: Você tem uma carreira longa e inspiradora e além do trabalho solo, já fez parte do coletivo Pau-de-dá-em-doido e dos grupos Simples e Rimas & Melodias. Quais foram os aprendizados que tirou desses projetos? 

Stefanie: Tenho muito orgulho e me sinto extremamente privilegiada em ter trabalhado com tantas pessoas e artistas incríveis. Eu era menina quando comecei a cantar, então foi um período em que eu ficava muito quieta, só observando. Lembro que os meninos conversavam muito no meio dos shows, teve até uma vez que eles pediram para eu falar mais, mas eu era bem tímida e preferia ficar na minha. Hoje eu me sinto muito mais a vontade para ser quem eu realmente sou e falar o que eu acho e/ou penso sobre um determinado momento ou assunto. Acho que eu aprendi que devo ser verdadeira na minha arte. Aprendi que estar no palco é importante, mas para isso, é necessário se preparar, ensaiar e bolar um plano para apresentar algo bacana para o público. Aprendi que estar no palco é muito mais que apenas cantar, é fazer com amor e se divertir para que cada processo seja mágico. Tive a oportunidade de trabalhar primeiro com muitos homens e depois com muitas mulheres, e posso dizer que foi uma experiência transformadora pra mim, pois são universos completamente diferentes. Mulheres são mais vaidosas, gostam de se arrumar, se maquiar, etc e eu já não fazia tanto isso quando estava apenas com os meninos. Fora que os assuntos levantados pra criar uma música também são diferentes e isso foi muito enriquecedor, a gente vive aprendendo com as pessoas. Hoje eu acredito que aprendi com todos que trabalhei, sinto que devo sempre entregar o meu melhor e fazer um trampo com excelência. Vivo aprendendo e vivo de aprendizados.

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Li uma entrevista onde você citou a Rubia RPW, a Nina Brown e a Negra Li como MCs que te inspiraram a começar no rap. Atualmente, quais artistas te inspiram? 

Atualmente, Little Simz e Rapsody me inspiram muito. Mas falando de artistas nacionais, os últimos trabalhos que venho acompanhando, fora as meninas do Rimas & Melodias, que são minhas irmãs, são as super talentosas Isa Sabino, Bianca Hoffmann, Killa Bi, Preta Ary, Ebony e Monna Brutal.

Alguma delas é o seu feat dos sonhos? 

Little Simz e Rapsody na mesma faixa seria um sonho!

Ainda falando das preferidas: Qual música escreveu que mais se identifica?

Me identifico com todas, mas por ser uma pessoa muito ligada a minha família e amigos, o single “Pelos Meus Amores” mexe muito comigo. A letra dessa música é muito especial e me remete demais as pessoas que mais amo na vida.

Sobre sua família, teve algo na maternidade que influenciou no seu modo de criar? Você passou a enxergar o mundo e o seu trabalho de outra maneira após o nascimento do Humberto e da Malena?

Com certeza a maternidade influenciou e continua influenciando, não apenas na minha carreira, mas em toda a minha existência. Quando eu estava esperando o Humberto, meu tio me disse algo que eu nunca vou esquecer: “Agora você vai saber o que é responsabilidade de verdade!” e de fato, hoje os meus valores são outros. Antes eu me dava ao luxo de ficar em cima do muro sobre o que eu queria fazer da vida, mas com eles passei a ser muito mais decidida, hoje eu sei quais são as minhas prioridades. É um universo onde você passa grande parte do tempo abdicando das suas coisas, daquelas 24h que antes você tinha só pra pensar em você, mas que agora são divididas. O barato é louco de verdade e a gente tem que encontrar maneiras de se organizar e se adaptar. Às vezes a gente quer dar conta de tudo e acaba não rolando, mas não podemos nos cobrar tanto, tá tudo bem não ser perfeita, a maternidade não é perfeita e nem nós. Em contrapartida, não existe sentimento mais puro que esse amor, ele é o grande motivador da minha vida. 

Outra coisa que te motiva bastante é a troca que tem com outras mulheres que estão na música ou que são admiradoras do seu trabalho, né? Para você, qual a importância dessa união e como projeta o cenário futuro do rap diante disso?

Eu acredito demais em um futuro cada vez mais próspero. Eu tive a oportunidade de acompanhar o rap desde os anos 90 até hoje e todas as mudanças que ocorreram durante essa trajetória. Atualmente, eu consigo ver um grande progresso e um número bem maior de mulheres atuando e mostrando a sua arte. É claro que ainda temos que melhorar muita coisa e existem muitos espaços que ainda precisam ser ocupados, mas o diálogo constante sobre esses assuntos tem feito a gente tomar cada vez mais consciência do que precisa ser mudado, colocar a mão na massa, e não esperar que os outros façam pela gente. Temos que nos unir cada vez mais.

Você é uma referência para muita gente e em algumas entrevistas comentou sobre o “só falar aquilo que sustenta” e de como usa o rap para trocar uma ideia com as pessoas. Queria que comentasse mais sobre essa preocupação que reflete na construção da sua arte. 

Vou te dizer que a nossa vida é um eterno aprendizado. Posso até falar somente o que eu vou sustentar, até mesmo porque não sustentar o que você fala é uma farsa. Mas pode acontecer também de lá na frente eu mudar de opinião, porque na minha vida eu vou ter vivido outras coisas e ter um outro grau de consciência. Assisti um episódio da série Dark na Netflix, onde dois homens (que eram a mesma pessoa, só que um era o mais velho e outro o mais novo) conversavam, e o mais velho dizia para o mais novo que ele teve que passar por muitas experiências pra se tornar a pessoa que ele se tornou hoje, achei isso muito especial. Por outro lado, acho que por eu ter vivido um período dentro do rap e do hip-hop com um lado militante muito forte e que gritava por justiça, fez com que eu me tornasse a artista que eu sou hoje. Acho que eu tenho um certo cuidado com o que eu caneto, até mesmo porque eu sei quantas pessoas já chegaram em mim e falaram que minhas letras influenciaram muito em suas vidas e decisões. Acho que eu canto o que gostaria de escutar, em diferentes momentos. Falar algo que de alguma forma vá ajudar alguém me preenche, eu sou muito assim com os meus amigos. Mas a arte é livre, cada um canta o que acha que tem que cantar. Eu expresso tudo aquilo que sinto.

Você citou Dark acima. O que mais tem assistido, escutado e lido nos últimos tempos?

Pra ser bem sincera, ultimamente estou escutando muita música infantil, por conta da Malena! Brincadeiras a parte, eu estou mais focada ouvindo beats e produções para definirmos os próximos singles que serão lançados e o meu planejamento. Fora isso, eu estou estudando muito sobre Espiritualidade, Física Quântica e PNL (Programação Neurolinguística). Não sei o motivo, mas esses assuntos chegaram até mim nesse período de isolamento e eu estou achando muito interessante. Acabei de ler “As Sete Leis Espirituais do Sucesso” do Deepak Chopra, comecei a ler “O Caminho do Artista” da Julia Cameron e “Caibalion” de Ricardo Uchôa

Foto: Renato Nascimento

Nesse planejamento tem algo indo de encontro ao samba, já que cresceu nesse meio?

Quando eu era pequena, montamos um grupo de samba com os amigos da minha rua, mas foi coisa de criança, rolaram alguns ensaios e nada mais. Eu gostava muito dos instrumentos e tinha muita curiosidade em aprender a tocar, mas acabei não dando continuidade. Eu super consigo me imaginar rimando em um samba, ou em um feat com algum artista do samba. Eu acho incrível a mistura desses dois estilos, eles combinam demais. 

Do samba ao rap, como é o seu processo criativo? Acha que ele mudou muito?

Meu processo criativo não mudou muito do começo para hoje, acredito que eu fui apenas aprimorando com o tempo. Eu sempre gostei de escutar o que o beat tinha a me dizer e escrever em cima, mas também já surgiram algumas batidas imaginárias na minha cabeça a partir de letras que criei, ou letras que canetei e depois procurei o beat perfeito pra gravar. Cada música que faço tem uma história e isso é o mais especial. 

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Isso tem se mantido também na quarentena? Como tem sido esse período pra você?

A quarentena afetou tudo! Rs. A Malena tem 1 ano e 6 meses, quer a minha atenção o tempo todo. O Humberto passou a estudar em casa, acabei virando professora, então quando não estou fazendo lição com ele, ele também quer a minha atenção. Fora isso, tem todas as outras coisas que precisam ser feitas na casa, chega uma hora que me pego exausta. Por sorte, tenho a minha mãe, duas amigas que me ajudam muito e também o meu marido, com quem divido as tarefas. Consegui me organizar para arrumar um período do dia em que me dedico um tempo apenas pra trabalhar, seja escrever, estudar ou falar com a minha empresária sobre o nosso planejamento. Enfim, 24h tem sido pouco, pois é muita coisa pra fazer, mas o segredo é viver um dia de cada vez. Fé!

E como tem cuidado da mente se desdobrando entre tantas demandas?

Sempre gostei muito de fazer as minhas orações, e nesse período de isolamento, conheci a meditação. A meditação me trouxe um pouco mais de tranquilidade e equilíbrio para a mente. Os dias em que não consigo fazer por conta da correria, sinto muita falta e vejo a diferença que faz no meu dia e humor.

Com tudo que você contou deu para perceber que está sempre na correria. Tá sobrando tempo para planejar os projetos? Pretende lançar músicas e clipes em breve?

Pretendo sim, sem dúvidas! Já estamos trabalhando no planejamento do próximo semestre para logo termos mais lançamentos na rua. E em breve terei muitas outras novidades também…

E o seu disco, como está o andamento? 

Por conta de todos esses acontecimentos, demos uma desacelerada, mas já estamos trabalhando e em breve teremos novidades. Mas antes virão alguns singles!

 Para finalizar: O que você quer para este ano ainda?

Continuar focada no meu trabalho, estudar e me aprimorar cada vez mais. Tudo o que consumo, leio e estudo me inspira demais para escrever. Quanto a música, estou super focada em lançar os singles que estamos preparando e planejando. O céu é o limite.

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