No dia 7 de fevereiro, o mundo todo celebra o “Dilla day”, data em que é comemorado o nascimento de James Dewitt Yancey. O produtor é tão importante que, anualmente, são realizados eventos por todo os Estados Unidos – e, claro, em Detroit, para celebrar sua vida em forma de música.

J Dilla, durante uma sessão de "Crate digging"

J Dilla, durante uma sessão de “Crate digging”

Já no dia 10 de fevereiro, o mundo passa a lamentar  a morte física do mestre, ocorrida neste dia em 2006, devido a uma doença rara no sangue.

Nem mesmo a morte morte precoce de DIlla foi capaz de apagar sua obra ou deixa-lo no limbo de artistas esquecidos, como tentou prever um dos seus primeiros registros gravados, “The Album That Time Forgot”. Não foi o caso.

Seja como produtor ou MC, Jay Dee definiu os rumos de um RAP que fugia da temática gangsta, hemegônica nos anos 90, mostrando que o hip-hop podia ir além em musicalidade, temática e produção. Fez da sua MCP3000 a extensão de si mesmo e de todos os instrumentos dos quais dominava a condução. Eternizou linhas de baixo e caixas, sempre lembradas como “timbres do Dilla”, assim como criou ambiente para que artistas como A Tribe Called Quest, De La Soul, Common, Erykah Badu, Busta Rhymes e tantos outros pudessem se tornar imortais.

Hoje, o Raplogia, afim de homenagear o legado do produtor de Detroit, trás uma lista com 11 discos produzidos por J Dilla, seja com participações, rimas ou como peça principal. Sua obra é tão grande quanto sua importância, então deixamos aqui nossa visão sobre a história de Dilla, entendendo que cada um dos que o amam, tem suas próprias preferências e clássicos dentro do catálogo gigante que Jay nos deixou!

 

1. 5 Elememtz – The Album That Time Forgot (1998)

Em 1998, J Dilla, junto de Proof (D12), DJ Sicari, Thyme & Mudd lançaram o primeiro disco do quinteto de Detroit “5 Elementz”. Como o próprio nome do disco sugere, o álbum foi esquecido pelo tempo e poucos fãs do produtor o conhecem. Fato é que a produção seguia uma linha parecida com o que vinha sendo feito em parte de Nova York, com Dilla produzindo todas as batidas. Álbum essencial para entender o início da carreira do produtor!

 

2. The Pharcyde – Labcabincalifornia (1995)

The Pharcyde é um dos mais importantes grupos dessa leva do “Hip-hop underground”, surgida em meados dos anos 90. Oriundos da Costa Oeste, mais precisamente da California, Pharcyde correu por fora da bolha de influência do G-Funk e trouxe um disco mais parecido com o que A Tribe Called Quest vinha fazendo em Nova York. Mais do que um clássico, o disco trouxe ao mundo uma das mais conhecidas faixas produzidas por J Dilla, “Runnin”, sampleando o clássico da Bossa nova “Saudade vem correndo”, de Stan Getz, e mostrando ao mundo o poder da Música Popular Brasileira. O resto é história!

3. Slum Village – Fantastic vl.2 (2000)

Entre 1996 e 1997, Baatin, T3 e J Dilla formaram o Slum Village, lançando seu primeiro disco, “Fantastic vl.1”. Mas, em 2000, o segundo volume do álbum fez barulho, colocando o grupo no seleto hall de grandes artistas da cena alternativa do RAP, que estava mudando completamente o jogo.

“Fantastic vl. 2” é uma obra-prima, com canções abordando amor, sexo, e outras temáticas pouco usuais para os moldes do movimento. Dilla trás nessa produção o supra sumo dos sons que saiam de sua MPC, com linhas de baixo perfeitas e beirando, por vezes, a psicoledia, aliadas à batidas menos agressivas. É inegável a quantidade de singles do disco que foram eternizadas, como “Player”, “Tell me” e “Fall in love”. Álbum indispensável para entender o processo criativo de Jay.

 

4. J Dilla – Donuts (2006)

Considerado por alguns como a melhor beat tape de RAP e o trabalho mais genial de Dilla, “Donuts” foi lançada no dia do seu último aniversário em vida, três dias antes de sua morte.

A ordem das faixas também é incomum: o álbum começa com um “outro” e termina com a introdução. É uma metáfora quase perfeita demais para a habilidade sobrenatural de Dilla de tirar o máximo proveito de qualquer coisa que ele tenha experimentado. O final da trilha final flui direto para o começo da primeira, formando um loop infinito, e aludindo à forma circular dos donuts. (Collin Robinson, do Stereogum)

O álbum foi produzido em sua maior parte dentro do quarto de um hospital, com Dilla já debilitado com a doença que lhe tirou a vida. 29 das 31 faixas do disco foram produzidas nessas condições, com Dee usando um Boss SP-303 e um pequeno toca-discos  que seus amigos trouxeram.

Muitos veículos declararam “Donuts” como um clássico e uma obra genial, colocando o disco em listas de maiores produções de 2006 e dos anos 2000 em geral, algo incomum para um disco de batidas.

Não é a toa que eu tenho esse disco tatuado, ao lado dos desenhos de Quasimoto e MFDOOM. Clássico!

 

5. J Dilla – The Shining  (2006)

Assim como “Donuts”, o disco “The Shinnig” também foi produzido, em grande parte, num quarto de hospital, durante os últimos dias de vida de Jay Dee. Infelizmente, o disco não foi terminado antes da passagem do produtor, sendo finalizado e lançado postumamente, em outubro de 2006.

Diferente de  “Donuts”, esse trabalho contém não só batidas lendárias de Dilla, mas também mostras de seu talento como escritor e rimador, além de participações de gente como Madlib, D’Angelo, J Rocc, Dwele, Common e MED. É um disco extremamente enérgico e potente, considerado o ápice de sua produção dentre os adoradores de Jay, pois mostra uma enorme evolução em suas técnicas e habilidades.

 

6. Jaylib – Champion Sound (2001 – 2003)

“Champion Sound” é como um registro do encontro de dois deuses. Nas primeiras vezes em que ouvi o disco, tive a sensação de esperar mais da junção de Dilla com Madlib, o que me fez demorar pra entender a proposta. Hoje falo com tranquilidade em como esse disco é incrível! Precisamos entender que, em 2003, a dupla ainda não tinha o status que tem hoje, então, pensando em 2019, podemos perceber como Jaylib foi um presente para todos nós.

Metade do disco foi produzido por Madlib e cantando por Dilla, com o oposto também acontecendo.

Como todo disco que envolva um dos produtores, a história é incrível: Madlib recebeu de J Rocc um CD com batidas de Dilla. Então, Lib gravou algumas rimas em cima, sem pretensão de libera-lo como um disco, e rotulou o conjunto das faixas como “Jaylib”. A Stones Throw, então, liberou algumas dessas gravações no lado B de uma promo de Madlib. Dilla ouviu, gostou, e então decidiram gravar o disco que viria a se chamar “Champion Sound”.

Madlib fez sus parte na Califórnia e J Dilla em Detroit. Em 2004, com s mudança de Jay para a Califórnia, a dupla se juntou e fez algumas turnês de lançamento do disco. Se você não se emocionar ouvindo “The Red”, precisa rever o seu amor pela música!

Em 2010, a Black Milk listou o disco como um dos top 10 álbuns da década.

 

7. A Tribe Called Quest – Beats, Rhymes and Life (1996)

Esse não é exatamente um dos discos mais aclamados do A Tribe Called Quest, mas aqui aconteceu algo importante: Em 1996, Dilla se juntou à Q-Tip e All Shareed Muhammad, formando o The Ummah, um trio de produtores que conduziu a sonoridade do próprio ATCQ em alguns discos, como de Busta Rhymes e alguns remixes para Craig Mack. A efeito de informação, “Ummah” é um termo oriundo do Islã, que significa “comunidade. É sabido que Q-Tip e All Shareed seguiam o Alcorão, então podemos ter uma pista das crenças de Jay Dee.

 

8. J dilla – Welcome 2 Detroit

Muitos artistas usam de seus bairros em nomes de discos, faixas, como forma de mostrar orgulho de onde vieram, algo bastante marcante na cena americana do RAP. Dilla simplesmente quis mostrar o que Detroit tinha a dizer. É aqui que o produtor também faz as vezes de MC, com uma energia e entrega impressionantes, compensando o fato de não ser um MC acima da média.

Sendo o primeiro álbum solo de Dilla, foi também o início da transição do nome Jay Dee para J Dilla.

O produtor foi do Techno à Bossa nova, passando pelo Groove Brasileiro e Africano. É difícil categorizar o estilo de Dilla, sendo ele tão plural, o que o torna um eterno mestre das batidas.

 

9. Common – Like water for chocolate (2000)

Considerado um dos melhores álbuns de Common, LWFC é só uma das grandes parcerias que Dilla teve com gente como Erykah Badu, Common, Busta Rhymes e tantos outros baluartes do RAP e do R&B.  “The Light”, em especial, é minha faixa favorita. Unindo a voz inconfundível de Common, com os hi-hats riscados e linhas de sintetizador, é um deleite em instrumental, rimas e idéias.

 

10. De La Soul – Stakes is High (1996)

Assim como um atacante por vezes só precisa de um gol para se consagrar, Dilla assinou apenas uma faixa desse disco clássico do De La Soul, E isso faz com que o disco seja citado aqui, pois “Stakes is High” se tornou um dos singles mais emblemáticos da carreira do produtor.

Num vídeo publicado pelo grande Robert Glasper, a técnica para produzir essa faixa é contada, mostrando como o corte de apenas alguns timbres e notas de piano de uma faixa de Ahmad Jamal deram origem ao famoso baixo da faixa, que é conhecido por todos os grandes amantes do RAP e se tornando uma daquelas faixas marcantes já em seus primeiros segundos.

Também é possível ver Robert contando sobre um som produzido por Dilla, para o disco “Fantastic” de Slum Village.

Fato é que “Stakes is High”, faixa que dá nome ao disco, se tornou uma das mais conhecidas músicas  do De La Soul e de toda a carreira de Dilla.

 

11. J Dilla – The Diary (2016)

“The Diary” foi o último disco montado por Dilla para ser lançado, antes de sua morte. Em 2016 o disco foi finalmente liberado, trazendo participações de Snoop Dogg e Nas. “The Diary” é um disco onde Dilla volta a mostrar suas rimas, e uma das músicas que compõem o trabalho é também uma lenda do artista.

“Fuck the police” foi gravada entre 2001/2002, e é um som onde Dilla fala de um tema pouco tratado em sua trajetória: A violência policial, os subornos que os “agentes da lei” cometiam e como isso afetava a comunidade afro-americana.

On the count of 3 say Fuck The Police
1, 2, 3! Fuck The Police!

And see we got these fake cops, they thought he had a gun
Made a mistake cops, I hate cops, turn on the TV whats this?
Another cop busted for illegal business!

A faixa já havia sido lançada em um LP e com capa desenvolvida pelo lendário designer da Stones Throw, Jeff Jank, um dos idealizadores da imagem de Quasimoto. Porém, foi decidido que entraria também nesse disco, que, de tão bem produzido, dá a sensação de Dilla ainda vivo, colaborando com grandes artistas da história do RAP< que nutrem muito respeito pela imagem e trajetória do produtor de Detroit. E, sendo esse o seu último trabalho como produtor e MC, nos dá uma espécie de “marco final” da sua discografia.

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Com isso, encerramos essa pequena homenagem, listando apenas algumas das grandes obras que J Dilla nos deixou, numa trajetória curta mas impecável, e torcendo para que seu legado seja sempre lembrado, seja nos próximas “Dilla Day”, nos toca-discos mundo afora como no aprendizado das novas gerações sobre a história do Hip-hop. Rest in power, J Dilla!

10.

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Marco Aurélio

Marco Aurélio

Fotografo shows sujos onde frequento, escrevo rimas que nunca vou lançar e faço pautas sobre coisas que vocês (ainda) não conhecem.